O Prêmio ou Tesouro

Geralmente o prêmio é mesmo um tesouro – ouro ou jóias, a água da vida, o domínio de um reino, o dom da cura ou da profecia. É uma meta altamente individual, mas é sempre algo de grande valor para o herói. O Sol, corporificando o herói mítico, luta pela recompensa final, um núcleo indestrutível de identidade que justifica e convalida a existência. O herói e seu prêmio são na verdade a mesma coisa. O tesouro é o núcleo essencial do herói, seu lado divino que sempre esteve oculto em seu corpo mortal. Isso pode soar terrivelmente abstrato. Mas o sentido inerente de sermos um “eu” real, sólido e indestrutível é uma coisa muito preciosa e mágica, além de ser obtida a duras penas. Todas as situações de vida em que somos chamados a nos separarmos de algo e a defendermos nossos valores e metas forjam um pedaço desse “eu” e sofremos por ela a cada vez, já que a eterna mãe-dragão deve ser combatida repetidamente em seus diferentes disfarces.

Outra imagem da meta do herói é a reunião com o pai, ou sua redenção. Uma das histórias que melhor ilustra esse tema é a de Parsifal, o tolo sagrado que sai a procura do Graal. Isso nos leva a questão do Sol como símbolo daquilo que herdamos do pai pessoal. Se quisermos vivenciar plenamente o Sol, devemos nas palavras do I Ching, “trabalhar com aquilo que foi arruinado pelo pai”, dando nova vida a essas coisas.

Por vezes, o prêmio do herói é um elixir que precisa ser furtado. Esse elixir pode conferir a imortalidade, dons proféticos ou de cura, ou então, pode salvar o reino. O tema do elixir furtado surge com grande regularidade em contos de fadas e em mitos como o de Gilgamech, na Babilônia, ou como o de Prometeu que furtou o fogo sagrado de Zeus. A substância mágica costuma estar nas mãos de um monstro, dragão, feiticeiro ou bruxa, e o herói deve surrupiá-la e trazê-la de volta para o mundo mortal.

A solidão e a inimizade do coletivo com os equivalentes emocionais dos perigos com o que herói se defronta em suas lutas podem gerar a questão da culpa (e do medo de represália que a acompanha) em torno do furto do elixir que é outro aspecto importante da jornada solar. Há algo de ilícito em nos tornarmos nós mesmos, pois para isso é preciso tomar algo da psique coletiva, algo que era de propriedade do inconsciente coletivo. Quanto mais separados nos sentimos, tanto mais temos a sensação arquetípica da culpa. E a profunda sensação de renúncia inerente a uma dívida – para com a mãe, a família e o coletivo – é ativada por qualquer ato individual de criação que nos separa de todos eles.

Assim, o furto do elixir é um profundo rito de passagem, e uma vez consumado, as coisas não podem voltar ao que eram antes. Só podemos ir para frente e usar o elixir, que na verdade é nossa própria e preciosa unicidade. Mesmo se recuarmos um pouco ou regredirmos, de vez em quando, sob trânsitos pesados de Netuno, não poderemos desfazer aquilo que foi feito, sob a luz do Sol, a fantasia da fusão deve cessar. Há ainda o medo de represália, e o herói deve tentar se salvar depois de furtar o elixir, com todas as legiões de guardiões zangados, pois o coletivo retruca de fato, o que pode ser visto claramente na variação familiar quando um indivíduo se liberta de uma unidade familiar solidamente interligada. Isso também pode ser visto em grupos políticos, religiosos e profissionais quando um membro expressa uma opinião excessivamente original e tem maior sucesso criativo ou financeiro que os outros membros.

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